Dentro da ortopedia, o escafóide é amplamente conhecido por sua complexidade de consolidação. A fratura desse osso é temida por médicos e pacientes devido à dificuldade de recuperação. Mas por que isso acontece? Para entender, precisamos explorar a anatomia, vascularização e o mecanismo de fratura do escafóide.
Como costumo dizer aos meus alunos: “Frature qualquer osso, menos o escafóide!” Vamos examinar o caso de uma fratura de escafóide para entender o impacto dessa lesão.
Anatomia do Escafóide
O escafóide é um osso localizado no punho, mais precisamente no carpo. O carpo é composto por oito ossos divididos em duas fileiras:
- Fileira proximal: Escafóide, Semilunar, Piramidal e Pisiforme.
- Fileira distal: Trapézio, Trapezoide, Capitato e Hamato.
Esses ossos interagem com o rádio, formando a articulação rádio-cárpica, que é crucial para os movimentos do punho. Entre as duas fileiras, temos a articulação médio-cárpica, enquanto a fileira distal articula-se com os metacarpos, formando as articulações carpo-metacárpicas.
Posicionado na fileira proximal e localizado lateralmente, o escafóide articula-se diretamente com o rádio. Durante uma queda com a mão espalmada, é comum que o impacto cause fraturas no terço distal do rádio (conhecida como fratura de Colles), na cabeça do rádio ou no próprio escafóide.
Vascularização e Consolidação
Uma característica importante que afeta a consolidação do escafóide é a sua vascularização. Enquanto a maioria dos ossos costuma se consolidar em 4 a 8 semanas, o escafóide pode levar até 12 semanas para se recuperar completamente – isso se não houver complicações.
Mas por que a recuperação do escafóide é tão lenta? O principal motivo é o suprimento sanguíneo limitado desse osso. Para que ocorra a consolidação óssea, o suprimento de sangue é fundamental, pois ele carrega nutrientes como cálcio e fosfato, essenciais para a formação do calo ósseo e dos cristais de hidroxiapatita, que compõem a parte mineral do osso.
Circulação Retrógrada do Escafóide
O escafóide recebe seu suprimento de sangue de forma “retrógrada”, o que significa que o sangue flui no sentido distal para proximal – do órgão para o coração. Esse fluxo contrário torna a circulação mais lenta, dificultando a regeneração do osso e aumentando o risco de complicações, como necrose avascular, não-consolidação e pseudoartrose.
- Ramo dorsal: Responsável por 70-80% da vascularização, suprindo principalmente os terços médio e proximal.
- Ramo volar (palmar): Suprindo 20-30% do escafóide, com maior ênfase nos terços distal e médio.
Essa divisão no suprimento sanguíneo explica por que fraturas no terço proximal do escafóide são mais difíceis de consolidar e têm maior risco de complicações.
Mecanismo de Fratura do Escafóide
A fratura do escafóide geralmente ocorre quando a pessoa cai com a mão espalmada, transferindo o peso do corpo para o punho. Isso leva à fratura do escafóide ou do rádio. Quem sofre essa lesão sente dores na “tabaqueira anatômica” (região triangular entre o polegar e o punho) ao mover o punho e o polegar. Além disso, é comum ocorrer edema e, em alguns casos, equimose após alguns dias.
Na maioria dos casos, a fratura do escafóide não é visível imediatamente nas radiografias, podendo resultar em um diagnóstico inicial falso negativo. Se houver suspeita de fratura, é necessário imobilizar o punho e o polegar e repetir a radiografia após duas semanas para confirmar o diagnóstico.